Para o que der e vier
Para o Que Der e Vier (Are you here, 2013), de Matthew Weiner
Se as grandes séries que entopem a tela de TV com cabeças falantes são, muitas vezes, elogiadas pelo caráter “cinematográfico”, é natural que um dos nomes fortes da telinha tente migrar para os multiplex. O que se vê em Para o Que Der e Vier, primeiro longa-metragem de Matthew Wiener, é a continuação débil daquela que é a característica marcante da maioria das séries: a segurança provocada pela estrutura rígida. Ora, os seriados não seriam assim denominados se não fossem produzidos de modo análogo aos sanduíches do Burger King e dos carros da Crysler.
Por mais que se possa elogiar a qualidade do texto, a criatividade dos argumentos e sabe-se lá mais o quê, pouquíssimas séries de sucesso diferem-se uma das outras em estrutura. Mudam-se dramas pessoais e a profissão do protagonista – médico, publicitário, mafioso, detetive, político, agente do FBI –, que quase sempre demonstram “humanidade” tendo uma pitadinha de maldade, quando sua natureza é essencialmente boa, ou uma pitadinha de bondade, quando má na essência. Chegou-se ao apogeu deste paradigma e só se pode esperar pelo seu declínio e torcer para que outro surja no lugar, menos centrado na dependência psicológica provocada pelos personagens no público (para se medir tal patologia, basta relembrar dos inúmeros casos em que a morte de algum personagem causou revolta em fãs).
No cinema, Weiner condensa este paradigma e, claro, acrescenta outro: o do filme meio triste, meio feliz, com família disfuncional e final aberto. O que leva profissionais como este a tentar aventurar-se no cinema? A mesma pergunta pode ser dirigida a grupos de humoristas brasileiros, como Porta dos fundos e, anteriormente, Casseta e planeta. O que querem? Dinheiro, prestígio, marketing indireto para os produtos principais (as séries e os vídeos de internet)?
Em Para o Que Der e Vier, nunca chegamos a ver, de fato, um filme. Assistimos a um boneco de cera que reproduz algo que lembra o cinema. Um boneco, inclusive, que sequer parece fruto de domínio de artesanato, já que o diretor falha em quase todos os campos: o humor é pouco engraçado – a dinâmica entre o maconheiro que vive chapado e o maconheiro ocasional é, no cinema americano independente, o equivalente de algum quadro de A praça é nossa – e as cenas que exigem peso dramático ficam confinadas em chatíssimos planos/contraplanos em over the shoulder. Ou, pior ainda, em fazer a poesia naif soar… bem, menos naif.
Pontualmente durante a narrativa, o personagem de Owen Wilson tenta ver a vizinha tirar a roupa e sua visão é obstruída por uma árvore que ocupa o pátio que separa os dois prédios. Tomado por um arroubo egoísta, o homem consegue fazer com que a árvore seja cortada e, finalmente, vislumbrar a nudez da jovem, que lhe sorri, só para lhe fazer perceber que o espaço vazio deixado pela árvore o entristece. A relação entre o fato de o personagem deixar de ser um mulherengo egoísta e perceber que ama a moça natureba (que, por algum motivo obscuro, não aparece no cartaz do longa-metragem) e a árvore cortada é tão simplória e tola, que toda a suposta genialidade de Weiner na televisão deveria ser colocada em questionamento. Mad Man e Sopranos realmente são geniais e muito mais valorosas do que a maioria do cinema americano? (argumento que, embora pareça ter perdido força atualmente, foi forte há alguns anos). Ou, na tela menor da televisão nosso grau de exigência cai bastante? Parece que a resposta às duas perguntas já foi dada pelo próprio Weiner.
Wellington Sari
© 2016 Revista Interlúdio - Todos os direitos reservados - contato@revistainterludio.com.br