Boyhood
Boyhood – Da Infância à Juventude (2014), de Richard Linklater
Boyhood é um filme cujo próprio conceito o destaca no circuito comercial. O problema, no entanto, é que esta é a única razão pela qual ele chamará atenção, pois, de resto, pouco se diferencia de tantas outras produções sobre pequenos dramas domésticos vistos sob a ótica de uma criança em sua fase de amadurecimento. Portanto, falar sobre ele é lembrar que seus 39 dias de filmagens foram espalhados pelos últimos 12 anos, possibilitando, assim, que o espectador acompanhe o envelhecimento natural dos atores em cena.
Através deste experimento, por definição episódico e cronológico, Richard Linklater fará o possível para lembrar a todos de sua singular proposta, ressaltando, insistentemente, referências aos períodos na tela retratados. Acumulam-se, assim, videogames, lançamentos de livros da série Harry Potter, músicas pop (descartáveis ou não), eleições presidenciais e toda sorte de recursos para exibir, com precisão, tempo e espaço exatos.
Entretanto, tal esforço resulta numa autoconsciência típica às produções que recriam tempos passados, privando Boyhood justamente daquilo que, a princípio, o particularizaria, ou seja, a espontaneidade da encenação que sua ideia almejava.
O que vemos, consequentemente, é a chegada à adolescência de um garoto comum (Ellar Coltrane), na qual os pequenos eventos dramáticos irão quase sempre servir ao onipresente tema do escorrer da vida e, sobretudo, ao propósito de sublinhar a própria feitura de uma obra de arte, e não ao registro orgânico destas personagens e suas vidas ao longo do tempo. Logo, estranha-se a predileção do cineasta pela atualização de alguns clichês, como os padrastos alcoólatras (sim, no plural!), o pai (Ethan Hawke) – gente fina, mas ligeiramente irresponsável e ausente - ou a presença de uma mãe (Patricia Arquette) amorosa e austera. Mesmo a beleza de alguns personagens, que vêm e somem (como de fato ocorre na vida de qualquer um), ao final é parcialmente estragada, numa festa convenientemente arranjada para fechar alguns pontos do roteiro.
Linklater é um cineasta acima da média e Boyhood não é de todo ruim. Seus infortúnios são que seu tema e sua proposta já foram, pelo mesmo cineasta, melhor trabalhados em sua até então trilogia formada por Antes do Amanhecer, Antes do Anoitecer e Antes da Meia-Noite, deixando-o com uma incômoda sensação de poder ser, tranquilamente, discutido mesmo prescindindo a experiência de assisti-lo; o que, sabe-se, jamais poderá significar qualquer forma de elogio.
Bruno Cursini
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