Ano VII

O Grande Mestre

segunda-feira abr 28, 2014

O Grande Mestre (Yut do Jung Si, 2013), de Wong Kar-wai

A vida do artista marcial Yip Man (1893 – 1972) – divulgador do estilo wing chun de combate, e mestre de ninguém menos do que Bruce Lee – ganhou algumas cinebiografias nos últimos anos. No momento em que o celebrado Wong Kar-wai anunciou a sua intenção de prestar homenagens à figura do grande mestre anos atrás, a dupla formada pelo diretor Wilson Yip e o astro Donnie Yen largou na frente realizando duas produções a respeito: O Grande Mestre (2008) e O Grande Mestre 2 (2010) – o título nacional pode enganar os desavisados e fazê-los pensar que se trata do filme de Kar-wai. Mais tarde, aproveitando a onda, Herman Yau dirigiria outros dois filmes sobre o mesmo personagem: O Grande Mestre 3 -  Nasce uma Lenda (2010) e Yip Man: Jung Gik Yat Jin (2013), com Anthony Wong encarnando uma versão mais velha de Yip Man.

Apesar do sucesso dessas produções, O Grande Mestre de Kar-wai era vista como a versão que deixaria todas as outras para trás. Se não pelas cenas de lutas, pelo menos pela abordagem do diretor, que poderia fornecer um resultado menos convencional. Como se tornou habitual, o cineasta passou mais tempo preparando o roteiro e depois montando o material do que o rodando o filme. Toda a espera resultou em algo frustrante.

Primeira produção chinesa de Wong Kar-wai desde 2046 (2004), temos aqui a obra mais comercial do cineasta, o que não significa que seja algo palatável para grandes plateias. A versão internacional exibida no Brasil, com alguns minutos a menos, deixa a trama mais truncada e acaba piorando a experiência. Ao contrário de Cinzas do Tempo (1994), primeira incursão de Kar-wai no mundo das artes marciais, aqui a tradicional pretensão do cineasta se perde em meio a um excesso de filosofia taoista bem intencionada, mas que aborrece mais do que ilumina.

Desviando-se dos rumos de uma biografia típica, o roteiro não se concentra toda na vida de Yip Man e reserva um tempo considerável para o conflito entre a impetuosa Gong Er (Zhang Yi) e Ma San (Zhang Jin), o responsável pela morte do mestre Gong Yutian, o pai da garota. Outra falha do filme é a incapacidade em costurar as tramas dos personagens de maneira mais coesa e interessante. Yip Man acaba apagado diante do drama da moça.

O grande mestre do título é aqui menos um ser de carne e osso do que um ideal, um espírito elevado, invejado por outros personagens. Nem mesmo nos momentos de maior dificuldade, Kar-wai permite que o espectador vislumbre um sinal de fraqueza no seu herói. A cena de combate que abre o filme é um dos poucos momentos em que Yip Man deixa se der uma criatura quase etérea. Por sorte, o veterano coreógrafo de lutas Yuen Woo- ping não deixou as idiossincrasias do diretor atrapalharem, ainda que ele próprio esteja abaixo do que seu habitual.

Revezando-se entre um herói intocável, uma trama de vingança (a parte mais forte de O Grande Mestre) e um falatório chato sobre a essência das artes marciais, o filme se mostra inferior a qualquer capítulo da trilogia wuxia de Zhang Yimou. Desta vez, a pretensão de Kar-wai acabou perdendo para a perfumaria do outro, pois ao menos Yimou conseguiu criar cenas de combate memoráveis.

Leandro Cesar Caraça

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