Double Play
Double Play: James Benning e Richard Linklater (2013), de Gabe Klinger
O grande ponto de Double Play é a tentativa de se trabalhar sobre o improvável casal que os cineastas abordados formam. Improváveis, porém naturalmente amigos, como as imagens nos evidenciam. Assim, se revela, ao longo das conversas e das imagens sobre as quais Gabe Klinger trabalha, essa estranha semelhança, que é a de Benning, um sujeito das artes visuais mais concretas, portanto dotado de um cinema que é existencialista em sua natureza, uma vez que feito isoladamente com a equipe de um homem só, e Linklater, homem do cinema narrativo, por vezes mesmo hollywoodiano, a quem sempre foi caro as mesmas discussões filosóficas. E aquilo que parece ser o gancho instintivo: a relação entre as artes e os esportes, que são suas paixões e que contornam a vida e a obra dos dois.
O filme acompanha um período curto de dias em que Benning se deslocou para Austin, com uma série de pequenos eventos, numa estratégia de cena que é a de uma quase encenação. Linklater apresenta um filme de Benning na sua Austin Film Society, eles passeiam por uma colina onde os personagens de Slacker caminhavam, jogam basquete, tênis e beisebol no dia seguinte, jantam na casa de Linklater, e terminam indo visitar o QG da produtora de Linklater. São uma série de situações colocadas para que um improviso surja da interação dos personagens. Os melhores momentos surgem desta natureza e do charme inerentes destes dois sujeitos. Se há pouco tempo para maiores discussões, as que chegam ao filme são agradáveis e interessantes.
O uso de filmes dos cineastas para pontuar e evidenciar as naturezas de cada, fazendo alguns estudos interessantes, como o de juntar cenas repetidas ao longo dos filmes de Linklater, também funcionam a favor do filme. Não chega a ser propriamente um filme-ensaio, já que há uma ação presente, uma narrativa. Mas os retornos às obras deles formam esse conjunto de maneira equilibrada. Aprendemos, por exemplo, que a relação dos dois precede o sucesso de Linklater como cineasta, muito antes dele chegar a Hollywood. Tem muito mais a ver com este personagem que ressurge sempre no filme, a Austin Film Society, que é o que os une – o cinema.
Outro elemento curioso é a ausência da equipe em cena. Ao contrário desse elemento comum nos documentários contemporâneos, Gabe Klinger opta por tornar a sua presença evidente apenas na modulação. Mesmo com tantos momentos relaxados, jantares, jogos, ainda assim se resiste à tentação de fazer do filme algo sobre a experiência total dos realizadores.
Aqui, o ponto são os personagens. Quem colore o filme são eles, e só quem pode adicionar a eles é permitido em cena, como a montadora de Linklater, Sandra Adair. Nunca vemos uma câmera e a voz de Gabe Klinger, interagindo com os personagens, também não se permite em cena, o que só aumenta a sensação de se tratar de um filme de performance dos dois cineastas. Escolhem-se palcos, dão-se situações, e eles brilham. Nesse meio termo em que o filme se instala, entre o ensaio e a performance, as coisas funcionam do seu jeito, e se ajeitam umas às outras de forma efetiva, em um bom retrato dos personagens.
Guilherme Martins
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