Olhos Frios
Olhos Frios (Cold Eyes/Gamsijadeul, Coréia, 2013), de Kim Byong-seo e Jo Ui-seong
Olhos Frios chega a Mostra como parte integrante de um acordo entre os governos sul-coreano e brasileiro, junto com uma leva de outros filmes de estilos diferentes. Não deixa de ser curioso que nem o cineasta mais badalado no meio artístico de sua geração (Hong Sang-soo) nem o mais badalado comercialmente (Bong Joon-ho) tenham aportado na cidade com seus filmes, ainda que os últimos longas de Hong tenham sido exibidos no Festival do Rio. Olhos Frios é uma produção de porte considerável, um dos maiores sucessos recentes de seu cinema. Comprova, em parte, que a indústria oriental se alimenta entre si, sendo uma refilmagem de Eyes in the Sky, sucesso comercial em Hong Kong – e fruto da produtora Milkyway, de Johnnie To. É um filme de ação com seus méritos.
Trata-se de um filme com um sério problema central. Sua engenhosidade dramática funciona no desenvolvimento das relações entre os personagens, mas jamais encontra a mesma efetividade enquanto maquina imagens. A sequência inicial, onde somos apresentados ao teste que introduz a personagem principal a seu novo trabalho, como parte de uma equipe de policiais com um talento especial de mapear ambientes públicos, e ao mesmo tempo testemunhamos o preparo e execução de um assalto a banco meticuloso pelo vilão, é o exemplo evidente. As relações estão dadas, bem postas. No entanto, os arroubos formalistas são desajeitados, desinteressantes, quase soam como uma obrigação, como se fosse necessário forja-los.
Não será a única vez que veremos o filme se atropelar para tentar se filiar ao estilo engenhoso que permeia muitas produções de sucesso na indústria de Hong Kong. No entanto, isso aparece cá e lá, em momentos em que o filme assume sua faceta “ação”. Se os cineastas não sabem brincar de montagem paralela à De Palma, isso não significa que eles sejam desprovidos de talento.
Há ótimos momentos, sobretudo nas sequências entre a equipe, e nas relações internas entre esses personagens. O que há de especial, me parece ser o fato de que as coisas são construídas na ação. Não temos tempo para a vida pessoal ou tomadas de fôlego de outro tipo dos personagens. O afeto, a honra, os momentos de humor genuínos e numerosos, surgem sempre no campo de batalha. Não há nada de muito equivocado com as sequências que acompanham o vilão, sujeito indestrutível. Talvez apenas que, ao mostrá-lo também com um ponto de vista, o filme perca um pouco da força que o impulsiona moralmente. Até que ele se desfaça dessa jornada que acompanhamos (de um cara que quer parar de cometer crimes e tudo mais para, enfim, agir como um vilão), os cineastas quase nos convencem de que a equipe não deveria capturá-lo. Mas ele assumirá seu papel em dado momento, ainda que exista uma certa ideia de cumplicidade, nem que seja pelo fato de o vilão ser tão indestrutível quanto o principal herói.
Ao fim, resta um momento espertalhão, em que Simon Yam, astro do filme em que este é baseado, aparece em cena como um alvo da superequipe – espirituosa brincadeira, como o filme no geral se pretende, mas nada muito além do medíocre.
Guilherme Martins
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