Bling Ring
Bling Ring – A gangue de Hollywood (The Bling Ring, 2013), de Sofia Coppola
Sofia Coppola, agora no seu 5º filme, está construindo um olhar bastante interessante para a sociedade contemporânea. O vazio e o consumo parecem ser dois temas centrais. Única exceção é o seu primeiro filme, Virgens Suicidas, que tratava da família e os dilemas de um pai puritano em meio ao desejo, também carnal, das belas filhas pelo mundo e do mundo pelas belas filhas.
No mais, até mesmo quando fez um filme histórico, Maria Antonieta, o contemporâneo se fez presente, e, neste caso, dado o registro acentuadamente diacrônico do filme, algo evidenciado nos longos travellings pelos armários da rainha que encontravam, entre objetos de época, tênis e outras peças atuais, criando um paralelo expressivo entre a luxuosidade e opulência da corte francesa pré-revolução francesa com os tempos atuais de consumo voraz – sem contar no paralelo possível entre o glamour de Maria Antonieta e o de uma celebridade atual como Paris Hilton.
Bling Ring – A gangue de Hollywood trata dos dois temas, o consumo e o vazio, e conta um episódio real: a incursão criminosa pela casa de famosos, como a casa da própria Paris Hilton, por parte de um grupo de adolescentes bem de vida, mas mal criados, em busca de aventura, dinheiro, roupas e acessórios de marca, fato verídico, bastante explorado pela mídia que cobre Beverly Hills e os famosos.
Dada a força da história, que fala por si só, Sofia constrói o filme como que circunstanciando os episódios que culminaram com a prisão da gangue, tratando da referencialidade e não do poético, mostrando como os jovens se conheceram, quem eram, as primeiras invasões, as festas pós invasão e a repercussão que o caso teve quando a quadrilha foi descoberta, durante o julgamento e até a valorização que os jovens tiveram numa cultura que valoriza o gangsterismo e as celebridades gangsteres.
O retrato destes jovens, que se parecem bastante com muitos outros jovens mundo afora, cria um quadro corrosivo da atual sociedade, sociedade engolida pelo hiperindividualismo vazio e libidinoso do consumo que, ao se modificar e gerar modas transitórias, acaba, como já apontaram tantos teóricos de Morin a Bauman e Lipovestki, provocando o próprio esvaziamento do ser.
Sofia Coppola não julga os personagens; os fatos, atos e falas dos personagens bastam. Mas diz muito quando perscruta toda a luminosa fauna de objetos de desejo destes jovens, seja quando estes exploram quartos alheios, seja quando desfilam entre si buscando algum brilho, brilho que emana mais das roupas e acessórios, do que dos corpos, meros manequins esquálidos para suportar as vestes. As baladas regadas a muita bebida, cocaína e poses para redes sociais são outros ingredientes bastante presentes no filme.
Se em Encontros e Desencontros, e em menor medida em Em um lugar qualquer, o vazio era habitado por personagens simpáticos e cientes do seu infortúnio; aqui, o vazio é oco, um oco cheio de aparências e discursos de brilho efêmero.
Bling Ring não é um filme que ficará marcado pela construção da cena, das imagens e por uma atmosfera artística, mas é o registro de uma sociedade idiotizada e doente.
PS: foi o último trabalho do fotógrafo Harry Savides, a quem o filme é dedicado. Savides foi fotógrafo de vários filmes importantes, vários deles com Gus Van Sant.
Cesar Zamberlan
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