A Morte do Demônio
A Morte do Demônio (Evil Dead, 2013), de Fede Alvarez
Este novo A Morte do Demônio é uma atualização do filme de estreia homônimo de Sam Raimi, realizado em 1981 e distribuído comercialmente em 1983. Por atualização entenda-se mais violento e com efeitos mais realistas.
Tanto o original quanto este novo filiam-se a uma linhagem de horror que vem do Teatro do Grand Guignol, sala localizada em Paris e especializada, desde 1897, em espetáculos sanguinolentos baseados em efeitos e maquiagem.
Curiosamente, em 1963, um ano após o fechamento do teatro parisiense, surgiu o primeiro filme do subgênero do horror chamado gore, que oferece ao espectador quantidades abusivas (e para muitos enjoativas) de sangue espirrado ou jorrado. É estabelecida, assim, a versão cinematográfica do Grand Guignol.
(existe ainda, como nos lembra Jean-Baptiste Thoret, um outro gore dentro do cinema americano: o gore realista, surgido a partir do filme amador que Abraham Zapruder fez registrando o assassinato de John F. Kennedy e das imagens violentas da Guerra do Vietnã. Esse gore realista é muito presente no cinema americano dos anos 1960 e 70 – vide a sequência final de Taxi Driver, diversos filmes de Peckinpah, a explosão de Cassavetes em A Fúria…)
Essa obra inaugural chamou-se, apropriadamente, Banquete de Sangue, e foi dirigida pelo lunático Herschell Gordon Lewis. O primeiro A Morte do Demônio é filho direto do filme de Lewis, retomando com força o gore que estava ainda mais no subterrâneo do gênero. Podemos dizer que a refilmagem, antes de estabelecer parentesco com um dos dois, é na verdade uma nova encarnação do gore. Mais intensa, mais incômoda.
Ao contar a história de jovens que descobrem, numa cabana isolada em uma floresta, um livro capaz de despertar demônios, o diretor uruguaio Fede Alvarez, que também estreia em longa-metragem, capricha nos efeitos e nas explosões de vermelho e realiza um dos filmes mais perturbadores e violentos dos últimos tempos.
O diferencial deste novo filme é que temos uma personagem dependente química, que está num processo de abstinência após uma overdose. Graças a essa situação, existe uma relação entre o terrível momento de privação que ela passa e as imagens que inicialmente a atormentam (e depois passam a atormentar a todos). Como seu passado (e, de certa forma, também o presente) a condena, ninguém acredita no que ela vê, nem que foi estuprada por galhos de árvores.
Tal relação coloca o filme em contato com um dos maiores problemas sociais do mundo contemporâneo: as drogas. Mas não é esse o maior interesse de A Morte do Demônio versão 2013. A direção de Alvarez pode não ser inventiva como a de Raimi, mas é hábil o suficiente para nos deixar pregados na poltrona. Não é um filme de sustos, apesar de eles existirem a rodo. É um filme surpreendentemente de atmosfera, de preparação. Quanto mais ele nos prepara com uma atmosfera bem construída, mais tememos um simples movimento de câmera – que pode ser revelador ou não. Isso conta, porque em terra de cego…
Sérgio Alpendre
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