O Lado Bom da Vida
O Lado Bom da Vida (Silver Linings Playbook, 2012), de David O. Russell
Com O Vencedor, seu aclamado retorno em 2010 (seis anos depois do nada surpreendente fracasso de Huckabees: A Vida é Uma Comédia), David O. Russell parecia ter encontrado, nas convenções de uma narrativa de gênero, uma coesão que o seu cinema até o momento não era capaz de produzir.
Tratava-se de um competente filme de boxe, com direto a família problemática, volta por cima, romance e, ainda mais arriscado, um categórico final feliz. É como se o diretor estivesse adaptando para os multiplexes os elementos constituintes de basicamente qualquer produção americana recém-premiada em Sundance. O elenco evidentemente se destacava, com interpretações um tanto acima do tom, particularmente de Christian Bale, como o atormentado irmão do protagonista.
Pois é nesta mesma toada que segue O Lado Bom da Vida, com suas famílias disfuncionais e, veja só, um protagonista bipolar. Após alguns meses em uma instituição mental, o agora desempregado Pat (Bradley Cooper) vê-se novamente morando com os pais. O motivo de seu colapso é bastante claro: ao chegar do trabalho mais cedo que o usual, encontra as roupas de sua mulher jogadas pela casa enquanto, pelo rádio, escuta a música que tocou em seu casamento. Ao entrar no banheiro, a vê com o amante. Descontrolado, Pat quase o mata, fazendo com que todos enxerguem no fato apenas o seu destempero, e não a traição de sua amada.
Em uma situação não menos delicada está Tiffany (Jennifer Lawrence): uma jovem viúva tão bela que suas malsucedidas investidas em Pat o fazem parecer mais louco do que quando quebra janelas, atirando livros clássicos.
Eis o enredo para mais uma comédia agridoce, ancorada por tipos carentes e problemáticos. Dos tantos títulos que somos lembrados, ressalto um francês, Românticos Anônimos. Ali, também, a única razão que impedia a felicidade perene do casal era tão e somente a instabilidade emocional dos enamorados, tudo sob um certo elogio condescendente aos seus cambaleantes personagens. Há, no novo trabalho de Russell, um momento bastante representativo desta necessidade geral em buscar humor na depressão, quando o novo par, em sua primeira noite, discute quais medicamentos estão ingerindo para aplacar um pouco suas neuroses.
Mesmo que no final esteja em xeque o reforço do núcleo familiar, com o amor sendo o único remédio possível, o filme busca sua suposta particularidade nas recorrentes manifestações das inabilidades de seus personagens – pensamos também no pai de Pat, interpretado por Robert De Niro, um velho com transtorno obsessivo-compulsivo. Assim, o resultado é muito mais próximo de um Alexander Payne ou Jason Reitman, do que de Paul Thomas Anderson e Wes Anderson – cineastas com os quais David O. Russell foi, no começo de sua carreira, tão associado. Hoje, prefere trabalhar com bons atores, um roteiro previsível e uma mensagem moralizadora; em suma, com este seu novo placebo, recebeu oito indicações ao Oscar.
Bruno Cursini
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