Ano VII

O Hobbit: Uma Jornada Inesperada

sexta-feira dez 14, 2012

O Hobbit: Uma Jornada Inesperada (The Hobbit: An Enexpected Journey, 2012), de Peter Jackson

O blockbuster é fonte inesgotável de amaciamento da realidade. Quando os palestinos lutam pelo reconhecimento como Estado, reivindicando o direito à terra, recebem indiferença ou são massacrados por uma situação de guerra absurdamente desigual.

Quando, porém, a luta pela terra é retirada da realidade, tornada fábula do herói por acidente, em que humanos são substituídos por anões, elfos, magos, orcs, anéis, minada em tudo que leva de político, temos um filme como O Hobbit: Uma Jornada Inesperada.

Ignorando esse contexto extra-fílmico, resta o que O Hobbit tem de cinema. Ou seja, sobra quase nada. Peter Jackson dispõe de um arsenal tecnológico de possibilidades subaproveitado pelo excesso de cenas expositivas. O roteiro perde de vista que, em cinema, um personagem se define não pelo que diz, mas pelo que faz. São poucos os momentos em que essa noção sydfieldiana é posta com eficiência em prática.

Tal como Os Vingadores, o filme de Jackson também sofre para apresentar os personagens. Voz em off, narração, diálogos mastigados, pausas expositivas emperram o ritmo. A aventura dos heróis da Marvel, porém, engata mais rápido e, quando isso acontece, o filme ganha corpo, consistência e diversão. Já O Hobbit ameaça alguma solidez no andamento, mas faz inúmeras pausas geralmente para explicar o que está acontecendo. Só avança mesmo quando Bilbo Bolseiro, Gandalf e os treze anões lutam pela sobrevivência contra os orcs.

Talvez a resposta para tamanha enrolação esteja na falta de assunto. Não se justificam as quase três horas de filme. Nem a entrada de personagens chaves da trilogia O Senhor dos Anéis salva o filme do marasmo. Pelo contrário: até mesmo a inicialmente boa aparição de Sméagol é estendida de tal maneira que arruína a força da sequência.

Para os devotos da religião da Terra Média, serão lindas as citações à trilogia. Para os mortais, aqueles que não são dotados dessa rara capacidade em se encantar pela repetição, o saldo será dores nas nádegas depois de tanto tempo sentado, momentos de vergonha alheia (a entrada de Galadriel e a interpretação de Richard Armitage achando que está encenando Rei Lear) e uma pitada de déja vu com o tom de Martin Freeman à herói trapalhão típico de Tom Hanks.

Pois de inesperado O Hobbit não tem nada.

Heitor Augusto

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