Ano VII

Parte 8: Dois franceses

domingo out 28, 2012

Parte 8: Dois franceses: 38 Testemunhas e Imperdoável

Dois filmes franceses reforçam a ideia de que a cinematografia local vai mal das pernas. 38 Testemunhas, de Lucas Belvaux, fica no meio do caminho para uma interessante discussão, e Imperdoável carrega no título brasileiro sua própria condição.

Depois de uma trilogia bem irregular formada por Um Casal Admirável, Em Fuga e Acordo Quebrado, com cada filme explorando um gênero específico, e cujo ponto forte era justamente o terceiro, que tem um sequestro como espinha dorsal, Belvaux realizou o ótimo O Sequestro de um Herói, que mostra o trauma de um homem rico depois de ser sequestrado (Yvan Attal) e de ter voltado ao lar.

38 Testemunhas, com o mesmo Attal, explora uma questão ética: 38 pessoas testemunharam um cruel assassinato e nada fizeram para impedir; mantiveram-se no conforto de seus lares, protegidos por janelas com vistas panorâmicas, enquanto ouviam os gritos assustadores da vítima. Uma vez omissos, o que merecem? Será que a jornalista em busca da verdade não é tão nociva quanto esses 38 covardes? Por que todos na cidade portuária de La Havre são tão frios, e ao mesmo tempo tão linchadores morais?

O filme de Belvaux tem certo cuidado no enquadramento, mas é preguiçoso na decupagem. Algumas cenas se resolveriam com maior força em menos planos, mas Belvaux insiste na fragmentação do registro, raramente conseguindo bom resultado, e tenta evocar Ozu ( e seus brilhantes pillow shots), ao mostrar imagens estáticas da Rua Paris, onde aconteceu o crime, e do porto, onde trabalham algumas testemunhas. O que resulta é um filme demasiado frio, monocórdico ao extremo, com fantasmas que parecem nunca terem sido pessoas anteriormente.

Sobre o novo de André Téchiné, cujo título perdeu o plural na tradução, talvez para não ser confundido com uma obra-prima, podemos dizer que é outro filme em que a inconsequência dos personagens, uma patologia do cinema francês desde os anos 1980, atinge picos insuportáveis. A toada, no entanto, é quase uniformemente soporífera, com música pobremente calcada em Michael Nyman e atores subaproveitados – principalmente André Dussolier, velho escritor ainda pimpão (comparado a Hemingway por causa de seu orgulho viril) e Carole Bouquet, que faz caras e bocas como uma versão feminina do David Bowie atual. Tem ainda uma homenagem meio boba a Adriana Asti, a musa de Antes da Revolução.

Téchiné sempre foi um diretor irregular com dois belos filmes: Rendez-Vous e Rosas Selvagens, e nada mais de notável. Com Imperdoável contribui miseravelmente para esse cinema francês insosso que domina os circuitos e festivais.

Sérgio Alpendre

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