Ano VII

Ingrid Caven

sábado out 20, 2012

Ingrid Caven, Música e Voz (2012), de Bertrand Bonello

Ingrid Caven, Musica e Voz não é um filme, mas um show filmado. As impressões deste texto se guiam por essa constatação: o filme-show corresponde mais a um desejo de Bertrand Bonello em registrar Ingrid no palco e dividir com o mundo essas imagens do que fazer um documentário ou retrato de uma artista. É um registro de urgência, já que Bonello a filmou na última apresentação do Cité de la Musique, em Paris.

Só não é de todo descabido procurar resquícios de filme na peça musical de Bonello porque a protagonista, Ingrid, não só é atriz, mas articula seu show como um pequeno teatro. Ela, muito branca, cabeleira loura, atirada no pretume do palco, fazendo malabarismos com a voz, ora lírica, ora artista de cabaré. Ela sozinha justifica o uso do termo cênico nesse filme-show.

A impressão é que Ingrid é uma personagem saída de Berlim Alexanderplatz. Nos momentos em que ela se entrega  ao calor do palco, há uma vaga lembrança da atmosfera, da volúpia e do desequilíbrio do epílogo da antológica série de Fassbinder.

A referência ao diretor alemão não é à toa. Ingrid é uma de suas ex-companheiras (a lista é longa e tem tanto homens quanto mulheres) e também trabalhou em seus filmes – maior destaque para Num Ano de 13 Luas.

Espectadores desavisados na Mostra foram assistir a Ingrid Caven, Música e Voz provavelmente sem saber que se tratava de um show filmado. Resultado: a sala terminou praticamente vazia. Não é para tanto: se não temos um filme ou se em nada ele lembra o impacto de L'apollonide – Os Amores da Casa de Tolerância, Ingrid dá conta de prender a atenção.

Há um pouco de cabaré, de Brecht, de Stockhausen e de Fassbinder na sua performance. E há algo de fantasmagórico no pretume do palco que envolve a brancura de Ingrid, no jeito de cantar, que desafia o formato da canção popular de disco. Trechos de sua performance me lembraram o trabalho que Thiago Pethit tem feito aqui no Brasil.

Só não dá para se debruçar sobre Ingrid Caven, Música e Voz como fazemos com um filme. Que o vejamos como um show filmado. E aguardemos o próximo filme de Bonello.

Heitor Augusto

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