Mahler
Mahler – Uma Paixão Violenta (Mahler, 1974), de Ken Russell
Ao contrário da histeria de Andrzej Zulawski, a insanidade de Ken Russell sustenta-se razoavelmente bem nestes tempos ilógicos que vivemos. Podemos até assumir aquele velho clichê de que os filmes dessa fase mais maluca de Russell envelheceram bem, revelam-se hoje cheios de momentos inspirados.
Mahler está inserido em um período no qual seu cinema refletia uma certa crise, e padece de uma forte irregularidade. Quando é mais narrativo, tende a ser enfadonho, sobretudo depois que nos acostumamos a esperar de tudo nas próximas cenas, a partir de meia hora de filme. Quando é febril, torna-se envolvente, como se só fosse possível dar conta do universo mental de um grande músico por meio de suas pirações. O que não é bem verdade, já que Lisztomania sofre justamente por apresentar pirações em maior quantidade – e mais infames ainda – que em Mahler. O fato é que em Zulaski certamente acontece o contrário: os momentos mais narrativos são os mais palatáveis em O Importante é Amar. Russell, até então, cresce quanto mais desmedido for (e não penso aqui na boba citação do Morte em Veneza de Visconti, feito três anos antes). Mas é necessário que essa desmesura venha acompanhada de algo mais concreto.
O grande momento de Mahler responde a essa liberdade trazida por sua loucura (e a do compositor): é a sequência multireferencial da conversão, pensada como um filme mudo que se torna uma opereta ao final. O delírio toma conta em definitivo, e torna todas as sequências seguintes dentro do trem (momento em que o filme se passa, o restante sendo flashback ou imaginação) um tanto frouxas.
Sérgio Alpendre
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