Ano VII

7ª CineOP – 2º dia – Bravo Guerreiro, o filme sem final

domingo jun 24, 2012

7ª CineOP – 2º dia – Bravo Guerreiro, o filme sem final

Piada pronta: num festival em que se discute à preservação de arquivos e o respeito à memória do cinema brasileiro, a cópia de Bravo Guerreiro que foi enviada pela Cinemateca do MAM no Rio de Janeiro à CineOP veio com um rolo a menos.

Com isso, num filme que caminhava para um clímax do conflito existencial do deputado que toma consciência da comédia do poder, o público que foi ao Cine Vila Rica aqui Mostra de Cinema de Ouro Preto ficou sem saber o final desse pujante longa de Gustavo Dahl.

Uma pena. Mesmo. Bravo Guerreiro é um filme que responde ao seu presente – tanto que o “povo” é citado inúmeras vezes por seus supostos representantes, algo sobre o qual Glauber havia versado um anos antes de Dahl com Terra em Transe.

Ao mesmo tempo que o conteúdo do diálogo responde a um momento específico brasileiro, o filme de Dahl permanece com uma atualidade impressionante. Afinal, fala-se de política partidária, de conchavos, concessões, roubos ideológicos, sindicalismo, moral, ética. É um convite buscar os equivalentes de hoje para os três partidos fictícios que formam a cena do filme em 1968: o Partido Radical, do Povo e Nacional.

Numa interrupção da projeção do filme, um grupo de jornalistas e críticos ficou brincando de buscar equivalências. “Ah, o Partido Radical seria o PT, o do Povo seria o PSDB”. Acho divertido, mas difícil encontrar precisão nas comparações: há muito o PT deixou de ser esperança de esquerda para quem se enxerga à esquerda (não me digam que foi o aperto de mão de Lula com Maluf que abriu os olhos).

No capítulo comparações, vale olhar esse filme ao lado de Terra em Transe. Não para buscar valorações de quem é melhor e pior, mas sim pelos recursos de encenação. A câmera do filme de Glauber (operada por Dib Lutfi) é mais febria (como esquecer a cena em que José Lewgoy, Glauce Rocha, Paulo Autran e Jardel Filho discutem e a câmera baila com eles?). A da produção de Dahl (operada por Afonso Beato) é mais sóbria, observadora (vale citar a cena do almoço com a lagosta em que os políticos fritam outro membro do partido).

São calhamaços de diálogos com uma intensidade afirmativa absurda. Fala-se tanto e com tanta propriedade que é preciso rever o filme para lembrar dos diálogos com detalhes. Tudo com muito rigor de encenação, de embate duro entre os atores, de retirada do véu da sujeira ontológica da política partidária.

Mas com umas curvas de humor para quebrar a sisudez (“Ah, Fulano, se você não fosse tão rico seria um poeta incorrigível”) e ironia (“Eu quero me aposentar, ir pra Roma, terminar minha tese em Proust”).

Bravo Guerreiro é exigente, duro, pesado. Já quem um dos personagens, o do senador, interpretado por Mário Lago, lembrou Proust, vale a comparação: o filme de Dahl exige o mesmo esforço de uma leitura de Proust. Mas o Prazer da viagem e o fim da jornada valem o esforço.

Uma pena que a cópia enviada pela Cinemateca do MAM-RJ tornou a projeção na CineOP um coito interrompido. Vieram as preliminares, o contato, os beijos, o sexo. Mas na hora do gozo, alguém bateu na porta e berrou: “Pegadinha do Malandro”.

Heitor Augusto

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