Dia 2: Twiggy, Estradeiros e descaminhos
Dia 2: Twiggy, Estradeiros e os descaminhos
Dois filmes que não chegam a completar um caminho. O francês Twiggy, de Emmanuelle Millet, pelo menos chega perto com sua história da jovem garota que descobre que já está grávida de seis meses, apesar de seu corpo não apresentar os sinais de que carrega uma nova vida. É um filme triste à beça, sobre maternidade e responsabilidade. Cresce bastante nos minutos finais, quando acompanhamos o dilema da garota: ficar com o bebê ou encaminhá-lo para adoção? O dedo sendo colocado dentro da mão redondinha como forte ligação entre mãe e filha, complementada por uma carta que explicaria tudo para a criança no futuro. É um filme muito simples, como outros internacionais exibidos no festival. Às vezes simples demais, não nos permitindo um envolvimento maior. Por outro lado, tem também algumas elipses forçadas e tipicamente francesas (lembram as de Adeus Primeiro Amor, de Mia Hansen-Love, só que menos felizes). Fosse filmado com maior cuidado e força, seria um belo filme.
Já Estradeiros, de Sérgio Oliveira e Renata Pinheiro, é um convite ao tédio do começo ao fim com seu relato de diversos personagens que levam a vida na estrada. São neo-hippies ou coisa que o valha, integrantes de uma tribo nômade que vive da venda de artesanatos e penduricalhos e de viagens, e que serviu de pretexto para que o casal viajasse também.
Um colar de pérolas precisa de um barbante que o amarre, era a lição do diretor para o produtor vivido por Kirk Douglas em Assim Estava Escrito. Pois Estradeiros não tem nem pérolas nem barbante. É um emaranhado de situações coladas preguiçosamente (e pretensiosamente), dando a noção de filme ensaio sobre a viagem. Muitos podem dizer que há, sim, uma amarra consistente nessa história. Nesse caso, qualquer amarra viraria automaticamente consistente, e sabemos que não é assim que funciona. A câmera-bússola incomoda demais, virando de um lado para o outro, como um barco num maremoto, ou um ponteiro de bússola mesmo. É um desses tiques de diretor que pretende experimentar. Não cola. Em alguns momentos parece uma criança brincando com algo que está preso por uma base, mas gira ao toque de suas mãos. Um globo com o mapa-mundi, por exemplo. Essas giradas da câmera procuram mascarar a arbitrariedade com que umas imagens são seguidas por outras.
Estradeiros ainda lida mal com a pilhagem de elementos dos curtas do casal (juntos ou separados). De Superbarroco vem as inserções visuais que inserem a videoarte no longa, e que já transformavam o curta de Renata Pinheiro num porre. Do ótimo Praça Walt Disney, alguns momentos numa avenida e principalmente o plano autorama na estrada sinuosa, com a câmera acelerada. Do adorável Faço de Mim o Que Quero, o clima geral de comunidade em meio a uma cena urbana. Não vi os outros curtas feitos por Sérgio Oliveira, mas imagino que também tenham elementos representados em Estradeiros. Essa pilhagem não é algo negativo a priori, mas por ter sido feita em um conjunto que não diz a que veio, um colar de pérolas falsas sem um cordão que as juntasse, soa enfadonha como todo o resto. Pena que em sua estreia nos longas o casal tenha sucumbido ao experimentalismo arbitrário de que falava Clement Greenberg, e que aparece camuflado em diversos momentos do jovem cinema brasileiro.
Sérgio Alpendre
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